terça-feira, 13 de novembro de 2012

Presidência destinou verba a jornais que não existem


Veículos registrados em imóvel fechado receberam mais do que jornais de grande circulação

Folha de S. Paulo


A Presidência da República gastou R$ 135,6 mil para fazer publicidade oficial em cinco jornais de São Paulo que não existem.

As publicações fictícias são vinculadas à Laujar Empresa Jornalística S/C Ltda, com sede registrada num imóvel fechado e vazio, em São Bernardo do Campo (SP).

Essa empresa aparece em 11º lugar num ranking de 1.132 empresas que, desde o início do governo Dilma Rousseff, receberam recursos públicos da Presidência para veicular propaganda do governo em diários impressos.

Embora esteja à frente de empresas responsáveis por publicações de ampla circulação e tradição no país, como o gaúcho “Zero Hora” e o carioca “O Dia”, a Laujar não publica nenhum jornal.

Os cinco títulos da empresa beneficiados pela Presidência inexistem em bancas do ABC Paulista, onde supostamente são editados, não são cadastrados em nenhum sindicato de nenhuma categoria do universo editorial e são completamente desconhecidos de jornalistas e jornaleiros da região.

Também não aparecem em cadastros municipais de jornais aptos a fazer publicidade de prefeituras.

SEMELHANÇA

Além disso, exemplares enviados à Presidência como provas de que as publicações existem contêm sinais de serem forjados.

A Laujar mandou as supostas edições do dia 15 de março do ano passado do “Jornal do ABC Paulista”, “O Dia de Guarulhos”, “Gazeta de Osasco”, “Diário de Cubatão” e “O Paulistano”.

Todas elas têm os mesmos textos –a única diferença é o nome da publicação.

Uma das “reportagens” apresentadas contém declarações do então ministro do Trabalho, Carlos Lupi, dadas no próprio dia 15. O que torna impossível a impressão ter ocorrido na data informada nos jornais.

Na verdade, o texto é uma cópia de uma nota publicada no site da Folha na tarde daquele dia.

As impressões têm também um suposto anúncio de meia página da Unimed. A empresa de planos de saúde, no entanto, informou à Folha que nunca fez publicidade em nenhum dos “jornais” da empresa Laujar.

Também há registros de pagamentos efetuados pela Caixa Econômica Federal à empresa, mas os valores não foram divulgados pelo banco federal.

CHECAGEM

Para comprovar a existência de uma publicação que receberá dinheiro público para veicular propaganda federal, o governo exige apenas o envio de seis exemplares de datas aleatórias, definidas pela Secom, que é a Secretaria de Comunicação Social da Presidência.

Além disso, o órgão pede documento, registrado em cartório, no qual é o próprio responsável pelo veículo quem atesta sua tiragem.

A Laujar, por exemplo, declarou que seus jornais tinham uma tiragem total de 250 mil exemplares, vendidos por R$ 2,50 cada.

Se a informação fosse verdadeira, as supostas publicações da empresa teriam, juntas, uma circulação parecida com a do jornal “O Globo”, a quinta maior do país.

A Secom informou que, em maio, excluiu a empresa de seu cadastro.

Não pela inexistência dos cinco “jornais”, entretanto, mas porque segundo o órgão eles não falavam sobre questões específicas dos municípios onde circulavam.

Com isso, diz a secretaria da Presidência, a empresa não cumpriu o princípio da “regionalização” na distribuição de verbas publicitárias.

OUTRO LADO

A Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência), responsável pela liberação dos pagamentos à Laujar, disse que seguiu todas as exigências internas para a efetivação dos repasses.

Sobre o critério que a levou a escolher os jornais da empresa, afirmou que seguiu a “diretriz de regionalização” da publicidade oficial.

Ainda assim, informou em nota que, caso sejam encontrados “indícios de irregularidade, não hesitará em adotar medidas administrativas e/ou judiciais, de forma a garantir a preservação dos recursos públicos”.

A Presidência admitiu não ter feito verificações “in loco” para checar a existência dos jornais, mas citou o Anuário de Mídia produzido pela editora Meio&Mensagem, voltado para o mercado publicitário, para respaldar a versão de que os jornais existem.

No entanto, a editora informou à Folha que não faz checagem para a inclusão de veículos em seu anuário. Basta que a empresa envie dados gerais, como a tiragem, por e-mail ou por telefone.

A Propeg, agência que repassou o dinheiro da Secom, disse que não havia restrição à Laujar quando a verba foi transferida. “No exercício de 2011 não havia qualquer pendência de comprovação que desabonasse o referido veículo”, disse a diretora de mídia, Neide Santos.

A Caixa Econômica informou que a escolha dos meios de comunicação “levam em conta critério técnicos de mídia e as necessidades estratégicas da empresa”.

O dono da Laujar, Wilson Nascimento, disse que os jornais existem.

Ele afirma que o grupo de publicações existe há 24 anos e que elas circulam de terça a sábado. “Você encontra nas principais bancas da região [ABC Paulista].”

Ao ser confrontado com a informação de que a reportagem não encontrou os jornais, disse: “Na periferia você encontra”.

Mas Nascimento não quis indicar em qual banca. Também se negou a dizer o endereço da redação e do parque gráfico que diz possuir.

Em Guarulhos, por exemplo, donos de banca desconhecem os jornais. A pedido da Folha, Nascimento mostrou dois exemplares. Ambos apresentam o suposto anúncio da Unimed, que a própria empresa disse não ter feito, e textos copiados da internet.

Os títulos trazem no cabeçalho o mesmo lema da Folha, “um jornal a serviço do Brasil”.
Sobre o anúncio da Unimed, Nascimento disse se referir a um contrato com corretor “independente”. Ele disse ainda que o dinheiro que recebeu é menor do que o informado pelo governo.

Comentário

Este é o modelo ideal de imprensa para amplos setores do PT: além daqueles que são pagos para falar bem do governo e mal da oposição, também há os que recebem para não falar nada.

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