quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Yoani Sánchez: a mercenária e o teste do caixote

Yoani disse o que os ideólogos não queriam ouvir: “Vivo numa sociedade onde opinião é traição".

Por Flavio Morgenstern para amálgama atualidade & cultura



Yoani Sánchez chega ao Brasil sendo tão perseguida quanto é em sua Cuba natal. Não foi o povo brasileiro ou o governo (em sentido original) que promoveram o forrobodó: trata-se de um grupelho partidário defensor da ditadura cubana, muitas vezes pago para espalhar desinformação sobre a ativista.

A expressão “direitos humanos” tem um caráter curioso quando, ao invés de usada pela esquerda, é usada para analisá-la. Cesare Battisti, por exemplo, assassinou pessoas em nome de uma ditadura. É considerado um refugiado, um herói. Yoani Sánchez é perseguida por ser contrária ao regime que mais matou e violou os direitos humanos na América Latina no século XX. É tratada como uma bandida. Ou uma blogueira é tratada como bandida, e um assassino é tratado como escritor – vai do gosto por sangue de cada um.
As manifestações já vinham sendo preparadas pelo eixo de política externa que se torna cada vez mais forte na América Latina, e cujo poder passa a sorrateiramente incluir o Brasil com uma década de governo petista. Conforme denunciou a revista Veja, um dossiê foi preparado pela embaixada cubana e distribuído para peças cabeça que espalhariam difamações sobre a “farsa” Yoani Sánchez.
Os “críticos” de plantão apedrejaram a chamada de capa da revista (a crítica no Brasil dificilmente é feita abrindo algo para ler, e só depois criticando): “A conspiração cubano-petista contra a blogueira Yoani Sánchez”. Aparentemente, trataram como uma paranoia “ultraconservadora de direita” da revista (cujo único “direitismo” é admitir que o mercado funciona e que o Muro de Berlim caiu). Excelente noticia! Pensava-se por aqui que Lula e Fidel fossem amigos, tirassem fotos juntos, que a base de apoio do PT incluísse cubanófilos, que Fidel até tivesse vindo ao Brasil para a posse de Lula. Felizmente, fomos alertados por tais estudiosos que tudo isso foi delírio paranoico da nossa cabeça pequeno-burguesa.

O teste do caixote
Confirmando o prognóstico da revista, Yoani foi recebida sob vaias de militantes partidários da União da Juventude Rebelião, União da Juventude Socialista (UJS) e a Associação José Marti da Bahia já no aeroporto.
Com uma civilidade que raríssimas pessoas teriam, Yoani demonstrou educação e elegância formidáveis, em uma aula de democracia direta no estômago. Ao invés de se acuar diante de pessoas de comportamento (e ideologia) muito próximos do fascismo que tanto criticam, obtemperou fascistas com democracia: “Foi um banho de democracia e pluralidade, estou muito feliz e queria que em meu país pudéssemos expressar opiniões e propostas diferentes com esta liberdade.”
Yoani fez o que essa turma nunca fez e nunca fará: defendeu a liberdade do próximo. Defender a própria liberdade é pleonástico: até Mussolini ou Pol Pot o fizeram. Democrático mesmo é dizer: “É isso aí, você tem o direito de protestar contra mim. E prefiro que esse direito exista do que só eu poder falar.”
É uma situação perigosíssima quando entidades ligadas a um partido (ainda mais num sistema político em que recebem dinheiro do fundo partidário, ou seja, agem assim com dinheiro tomado mesmo de quem não votaria nessas pessoas nem contra o Cramunhão Ele Próprio) impedem que um filme seja exibido, um livro lançado, um blog lido. Foi o que fizeram esses militantes, impedindo a exibição de um documentário sobre a liberdade de expressão em Cuba e Honduras, planejado para ser exibido no Museu Parque do Saber, em Feira de Santana (BA). É inconcebível imaginar que até os caipirões do Tea Party tomem uma atitude parecida. Para tais militantes, já agindo como militares, virou lícito. Foi um dia na história brasileira em que a democracia foi seriamente ameaçada como só se viu na ditadura.
Yoani disse o que esses ideólogos não queriam ouvir (e impedir que quem quisesse ouvir ouvisse): “Vivo numa sociedade onde opinião é traição. Um governo que censura a literatura, grampeia linhas telefônicas. Vejo o conflito entre o governo e o povo.”
É estranho que um governo precise governar contra o povo e ainda ser considerado redentor por pessoas que não viveriam 30 dias como um cubano vive. Apenas considerando que você próprio é “o povo”, e não apenas você próprio em um cargo político, é que se pode dizer que ter alguma opinião livre contra você é “traição”. É o que os Castro fazem, e a mentira é comprada por essa galera impulsiva e violenta: Fidel fez de tudo para se confundir com Cuba. É uma mentira – ser a favor de Cuba é ser contra Fidel. Traição é defender uma ditadura que matou 73 mil pessoas em 50 anos, até hoje sem eleições. Pinochet matou pouco mais da metade. Os milicos brasileiros não passaram muito de 500 pessoas.
Yoani demonstra assim que o Brasil passou (por enquanto) no teste do caixote. É um teste simples que serve para averiguar se um país é livre ou não. Apenas tome um caixote, vá até uma praça pública bem movimentada, suba no caixote e fale mal do governo por 15 minutos. Se você não for preso, o país é livre.
intelligentsia esquerdista brasileira agiu como os stalinistas que pouco disfarçam que são. Era costume dizer na União Soviética que nos EUA você poderia ir na frente da Casa Branca e gritar “Down with Reagan!” e ninguém te prenderia. Mas os ditadores socialistas mostraram que a população interpretava mal o bem que eles próprios faziam ao mundo, comentando que você também poderia ir na frente do Kremlin e gritar “Down with Reagan!” que também não seria preso.
A própria Yoani notou essa diferença no modo de pensar (e falar abertamente) do brasileiro: “O cubano está com máscara, sempre o amigo está te ouvindo para delatar.” É o que mostra Orlando Figes, em Sussurros: as pessoas presas num regime socialista são obrigadas a sussurrar para poderem falar de política. Numa ditadura com justificativa “social”, sempre se pode acusar o outro de “traição” contra o povo, e, assim, um percentual altíssimo do tal “povo” vai preso. Além de se justificar o fracasso em melhorar a vida do povo (“o país está cheio de espiões, agentes do fascismo e traidores”), ainda é um modo bizarro de subir nos escalões do Estado policial e ter uma vida melhor, tomando os bens de quem foi pego “espionando”.
Esse método de pensar orwelliano é típico dessa camorra. O encontro de Yoani (que, afinal, não teve o documentário exibido) foi seguido por discurso justamente dos fascistóides que a injuriaram (coisa impensável em Cuba, logo após um dos soníferos discursos de Fidel).
Depois de repapagaiar aquela ladainha sobre “avanços sociais” cubanos (os dados são do próprio regime, algo como utilizar a propaganda eleitoral do Maluf para falar do seu sistema de saúde, o PAS, e usar os dados como exemplo de gestão), os militantes dizem que Yoani não faz críticas suficientes contra o bloqueio econômico americano. Estranho: Yoani faz. O tempo todo. Mas essa “dialética” falsa é típica de ditadores contrários ao livre exercício de pensamento, ao cuidado na hora de tirar conclusões de fatos (ao invés de usar ideologias como criadoras de fatos).
Se a ilha tem avanços sociais, parece não precisar se importar com o tal bloqueio, porque é uma maravilha. Se alguém diz que isso é meio falso, então é tudo culpa do bloqueio. Das duas formas, o sistema político atual em Cuba sai ganhando (e Cuba sai perdendo). Está tudo sempre justificado. Cara eu ganho, coroa você perde.
O próprio bloqueio econômico é, em si, uma farsa. Cuba comercia principalmente com a América. E o bloqueio, na verdade, valeria exclusivamente… para a América. Ademais, se o socialismo é necessário para evitar o “imperialismo” que é o comércio livre, por que querem comércio? Ele não é ruim? Ele não é contrarrevolucionário? Ele não é a causa da miséria brasileira? Não deve ser tudo estatal, e as coisas privadas são terríveis? A teoria esquerdista (sua filosofia, sua sociologia, sua psicologia, até sua linguística) não é uma explicação da realidade: é uma busca por desculpas.

A "mercenária"

A duplicidade de pensamento é séria em Cuba, pois o país é miserável, mas tem subsídios para casas e para apenas o básico da alimentação. Um restaurante pequeno brasileiro tem mais bife do que o consumido em um ano em Havana. Mas o arroz com feijão é fácil de conseguir – e apenas ele.
Uma das faixas mostradas no aeroporto contra Yoani despejava a mesma logorreia que se encontra no aeroporto José Marti: “Segundo a Unicef, existem 146 milhões de crianças subnutridas no mundo. Nenhuma delas é cubana.” É mesmo? De toda forma, parece que obesidade também não é lá um problema muito sério em Cuba, e é preciso ser muito ingênuo (ou muito socialista, o que dá no mesmo) para acreditar que é graças à medicina cubana (mortífera a níveis assustadores). Será que essas pessoas já se perguntaram quantas crianças em regimes de economia realmente livre são subnutridas? Quantas crianças subnutridas são suíças? Australianas? Canadenses? Neo-zelandesas? Sul-coreanas? Monegasca?
Na verdade, quem escreve uma pantomima dessas sabe muito bem que a estatização da economia gera miséria (não é preciso ler a história dos 35 milhões de mortos na União Soviética, do Holodomor ou de como Mao Zedong levou ao abate 75 milhões de pessoas reduzidas a comer cascas de árvore antes de morrerem de fome). Se o próprio Stalin sabia que a economia livre do Estado é melhor, não é Fidel que vi deixar de saber.
Esses politizados querem poder. E, concluindo obviamente que numa economia livre não terão poder sobre outras pessoas (cf. a melhor análise já feita sobre o fenômeno, O Poder, de Bertrand de Jouvenel), precisam pelo menos vender alguma curta vantagem para jurarem que estão fazendo o bem ao ter poder de censura sobre os outros. Daí as migalhas: arroz, feijão e uma pastinha para acompanhar. O filé mignon fica para a elite de poderosos. Nem é preciso ler o melhor relato já feito sobre o famélico desastre econômico vermelho (Socialismo, do melhor economista do mundo, Ludwig von Mises) para perceber. Ou você conhece quem queira implantar a Revolução e, no dia seguinte, voltar a viver como operário, por que não tá nem aí para poder político?
Disso há uma consequência inapelável. É preciso doutrinar os futuros mandados na pobreza. Ninguém aceitaria uma revolução em que você perde o que tinha (e, por isso, é sempre preciso apelar para o terror ou para alguma ideologia insana para fazer revoluções – usualmente, ambos). É preciso enfiar em suas cabeças de que consumir é ruim – ao mesmo tempo em que se promete “tirá-las da pobreza” (ou seja, consumir mais, mas sem usar essa palavra horrorosa).
Isso é feito em plano internacional. Circula na mídia paga a soldo pelo partido no poder no Brasil ilações sobre Yoani. Na reportagem de Veja, comenta-se que o embaixador cubano pretendia difamá-la usando “jornalistas favoráveis ao regime”. Ditaduras têm dessas – “jornalistas favoráveis”.
Salim Lamrani (que vocês já conheceram aqui) afirma que Yoani gasta por mês no Twitter o equivalente a dois anos de salários mínimos cubanos. Ele teve também um ataque de pelancas graças aos prêmios internacionais que Yoani recebeu (ela não poderia receber prêmios em dinheiro?) e o salário que recebe como correspondente do El País, além do Estadão e tantos outros que pagariam muito mais para tê-la entre seus colunistas.
Hummm. Quantos salários mínimos cubanos ganha o sr. Salim Lamrani? O salário mínimo cubano é de cerca de 20 dólares (sic). Uma corrida de táxi em São Paulo dificilmente sai por menos do que o que ganha um cubano. E por que Yoani, hoje figura internacional, não poderia ganhar graças a seus méritos – o que inclui ter simplesmente o blog mais influente da raça humana?
O salário do El País tão choramingado, por exemplo, é de cerca de US$ 6 mil – não uma fortuna, e na verdade não muito mais do que recebe financiado pelo pagador de impostos brasileiro Ricardo Poppi Martins, o subordinado (sim, fala-se do salário do subordinado) do chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, que estava em reunião na embaixada para soltar o dossiê contra Yoani. Onde está o dossiê contra Poppi? Será que as famílias dos ativistas de aeroporto ganham muito menos do que um salário do El País, mesmo que não sejam colunistas disputadas por qualquer jornal do mundo contrário a ditaduras?
Yoani, portanto, é considerada “mercenária”. Ora, é claro que Yoani passou a receber bem. Aliás, se eu puder pagar alguma coisa para ela, é só avisar. Pago de bom grado. É isso que se chama economia livre – paga-se para quem se queira, trabalha-se para quem se queira. Até a acusação de “agente da CIA” ganha contornos humorísticos (porém, reveladores do pensamento da esquerda) se a aceitarmos: será que Yoani foi escolhida pela CIA para divulgar informações anti-Castro por, sei lá, seu cabelo? Ou será que peitou um regime que censura a internet e, conseguindo acessar de hotéis onde a internet é livre apenas para turistas (o que exige uma coragem e uma economia brutal antes de se tornar conhecida), ao custo de quase metade do seu salário por meia hora, acabou se tornando conhecida?
Eu acharia que finalmente a CIA gastou o dinheiro do pagador de impostos americano de forma correta depois de uma história de fracassos, se isso for verdade. O que vem primeiro: falar mal de Castro ou receber dinheiro da CIA? Antes passavam décadas até descobrirem agentes da CIA. Hoje qualquer leitor de Paulo Henrique Amorim conhece seus nomes.
Aliás, isso é motivo para xingar Yoani, ou para xingar a imoralidade que os Castro pagam aos cubanos pelo privilégio de morar numa prisão política cercada de tubarões?
A acusação de “mercenária” ultrapassa as raias do risível. Não dá para entender por que ficar em Cuba e enfrentar uma ditadura, pensando no seu povo e na salvação de sua cultura, é ser “mercenário”, mas simplesmente fugir do país e deixar o povo e a cultura às mínguas (como Yoani tem toda a capacidade de fazer) seria menos egoísta.
Claro, para a esquerda, isso é motivo de crítica. Como disse o filósofo Francisco Razzo, se Yoani invadisse uma igreja com as tetas de fora para velhinhas rezando, estaria lutando por liberdade – mas, como só está escrevendo contra o regime dos Castro, faz-se dela apenas uma marionete da CIA e do capitalismo imperialista norte-americano. Ainda vale citar Roberto Rachewsky: o legal é ver que os socialistas temem uma pessoa que deve ter medo de baratas, mas não tem de canalhas.
Nenhuma contradição pode ser melhor do que a explicação final (com fotos no dossiê) dessa galera para a “farsa” Yoani, comprada por 11 em cada 10 de seus críticos mocorongos: “Para o governo de Raúl Castro, fotos comprovariam que Sanchez teria se rendido ao dinheiro porque bebe cerveja, come banana e vai à praia.”
Minha nossa! Que vida luxuosa, essa de agente da CIA. Enquanto isso, nós proletários aqui ferrados sendo explorados sem praia e sem banana, e, pior ainda, sem cerveja Sol.
É, amigos, só mesmo o socialismo para nos salvar dessa agente do imperialismo norte-americano.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Amém...


Como a venda de estatais salvou o Brasil





Economista traça um panorama da privatização no mundo e mostra que a ineficiência e a corrupção fazem parte da natureza dos Estados gigantes

por José Maria e Silva para o Jornal Opção


Ao contrário do Rai­mundo do poema de Carlos Drummond de Andrade, a palavra “privatização” até pode ser uma solução, mas no Brasil ela é mais do que uma rima para “palavrão” — é, em si mesma, uma palavra amaldiçoada. À sua simples menção, os políticos fazem o sinal da cruz, como se tivessem visto o Diabo. Tanto que, nas duas vezes em que foi candidato a presidente da Re­pública, em 2002 e 2010, José Serra jurava, nas entrevistas e discursos, que não iria privatizar empresas. E seu colega de tucanato, Geraldo Alckmin, quando enfrentou Luiz Inácio Lula da Silva em 2006, transformou-se num outdoor ambulante das empresas estatais. Quem se lembra desses episódios é o economista Rodrigo Constantino em seu livro “Privatize Já” (Editora Leya, 2012, R$ 39,90), lançado no final do ano passado, inclusive em formato digital (Edição Kindle, R$ 25,82). O livro é um libelo abalizado e bem humorado em favor da redução do tamanho do Estado e, a exemplo do histórico movimento pelas Diretas Já, também se propõe a ser um grito de guerra —não pela redemocratização do País, mas pela democratização da economia.
Sim, quando se lê com atenção e sem preconceitos o livro “Privatize Já”, fica muito claro que a ostensiva presença do Estado na sociedade (não só na economia) é profundamente antidemocrática. Se o movimento pelas Diretas Já devolveu ao cidadão seus direitos políticos, ainda falta ao Brasil devolver às pessoas seus direitos econômicos — começando pelo direito de não ser escravizado por impostos, que roubam o salário do trabalhador e o lucro das empresas, sem devolver praticamente nada em troca, pois os serviços públicos são muito ruins. Rodrigo Constantino, o autor de “Privatize Já”, é um jovem economista de 36 anos que defende, com verve, o liberalismo em artigos no jornal “O Globo”, na revista “Voto” e no sítio “Ordem Livre”. Autor prolífico, já publicou obras sobre a Escola Austríaca de economia, a romancista e filósofa Ayn Rand e até sobre o PT, com o sintomático título “Estrela Cadente”. Também publicou, em 2011, o livro “Liberal com Orgulho”, que, como indica o título, faz uma defesa sem vergonha (no bom sentido) do liberalismo, num País em que dizer que alguém é “neoliberal” é como xingar a mãe.

“Privatize Já” divide-se em 30 capítulos, que se agrupam em cinco partes. Na primeira (“Por que privatizar é melhor?”), o autor tece considerações gerais sobre os fundamentos da iniciativa privada e apresenta exemplos de privatizações em todo o mundo, com destaque para o modelo inglês de Margaret Thatcher. Na segunda parte (“Co­mo a privatização melhorou o Brasil”), traça comparativos entre diversos setores antes e depois do processo de privatização das estatais, comandado por Fernando Henrique Cardoso. Na terceira parte (“Como a privatização pode melhorar o Brasil”), enfrenta as vacas sagradas do estatismo: Petrobrás, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Na quarta parte (“Privatizem o mar”), dedica-se a nem sempre felizes exercícios de imaginação, buscando sacudir os sólidos alicerces da mentalidade estatizante do brasileiro. Por fim, reserva a última parte ao que chama de “privataria petista”, num contraponto ao livro “A Privataria Tucana” (Geração Editorial, 2011), do jornalista Amaury Ribeiro Jr.
Obra descontraída

Uma frase do economista Milton Friedman, gigante do liberalismo contemporâneo, inspira não só o conteúdo do livro, a que serve de epígrafe, mas também o estilo de Rodrigo Constantino. “Se colocarem o governo federal para administrar o deserto do Saara, em cinco anos faltará areia”, ironizava Friedman. Com a mesma desenvoltura do guru liberal norte-americano, Constantino salta da planilha de dados para os fatos do cotidiano e, com a verve de um cronista, recorre até a casos pitorescos para defender as privatizações. O projeto gráfico de “Privatize Já” ajuda a fazer do livro uma obra descontraída, em que, ao final de cada capítulo, o leitor se depara com textos curtos, em letras brancas sobre um fundo negro, trazendo, de forma sintética, exemplos concretos do que foi discutido no capítulo. O primeiro desses textos discorre brevemente sobre Rousseau, o inimigo número um da propriedade privada, um homem que amava a humanidade com o mesmo fervor com que desprezava o próximo, inclusive seus próprios filhos.

Já na introdução, o autor deixa claro que “privatizar não é uma panaceia, uma medida mágica que soluciona todos os problemas”, mas sustenta que “é, sim, um passo extremamente importante na direção de mais progresso, mais prosperidade e também mais liberdade”. Ao lado da epígrafe de Friedman, Constantino poderia ter posto o provérbio: “o olho do dono é que engorda o gado”. Pois “Privatize Já” sustenta a tese de que o sentimento de posse se alicerça na natureza humana, começando pelo próprio corpo e pelas pessoas e objetos que o “eu” conjuga na primeira pessoa: minha mãe, meu pai, meu brinquedo, quando criança, e meu filho, minha casa, meu carro, depois de adulto. “O fato de cuidarmos melhor do que é nosso não deveria ser motivo de muita discussão”, escreve Constantino. “Os donos de uma empresa cuidam bem dela, preocupam-se com seu destino no longo prazo, pois a empresa é deles, pertence eles. Já quando lidamos com a propriedade de terceiros, quando o bem não é nosso e estamos apenas temporariamente usufruindo dele, parece natural que o grau de dedicação seja menor”, acrescenta.
Prostituindo as estatais

O escritor e pregador norte-americano James Freeman Clar­ke, talvez inspirando-se em Thomas Jefferson, disse que “o político pensa na próxima eleição, enquanto o estadista pensa na próxima geração”. Essa frase virou praticamente um provérbio, de tão repetida, e só perde em popularidade no Brasil para um ditado que sintetiza a desconfiança do brasileiro em relação ao capitalismo: “Empresário só pensa no lucro”. Rodrigo Constantino vai radicalmente de encontro ao senso comum e sustenta que é o homem público e não o empresário quem se vê condicionado a pensar sempre no curto prazo: “Mesmo um grande político precisa ser reeleito para continuar na política. Isso coloca enorme pressão populista em sua gestão”. A tendência, segundo ele, é o político transformar a empresa estatal num cabide de emprego, sem se preocupar com a eficiência que o empreendimento privado exige de seu dono, sob pena de falência. O que leva o autor de “Privatize Já” a concluir: “O político tende a usar a estatal como uma prostituta, enquanto o empresário encara sua empresa como uma esposa, mãe de seus filhos, com quem pretende permanecer casado por toda a vida”.

Foi essa convicção de que o Estado não tem vocação para ser empresário que levou Mar­garet Thatcher a empreender um ousado programa de privatização na Inglaterra a partir de 1979 quando se tornou primeira-ministra. Na época, as ideias do economista britânico John Maynard Keynes imperavam na Europa e no mundo, desde o pós-guerra, inclusive no Reino Unido. “Uma das principais recomendações de Keynes era para o governo agir de forma contrária ao ciclo, ou seja, expandir os gastos no momento de recessão econômica e cortá-los na fase de crescimento acelerado, para suavizar as tendências da economia”, explica Rodrigo Constantino. Mas os discípulos de Keynes não seguiam o mestre à risca, eram “keynesianos manetas”, no dizer de Cons­tantino, que só se lembravam da recomendação de que o governo deve agir de forma contrária ao ciclo econômico nas fases de arrefecimento, quando aproveitavam para aumentar os gastos públicos através da emissão de moeda. Nos períodos de crescimento da economia, quando deveriam aproveitar para cortar os gastos públicos sem grandes impactos sociais, os “keynesianos manetas” continuavam cevando o Estado obeso.

Na Inglaterra, Margaret That­cher apostou na redução do Estado, dando mais liberdade ao mercado, com a privatização das empresas estatais. “Quando Thatcher deixou o poder, a presença de empresas estatais na indústria britânica tinha sido reduzida em cerca de 60%, segundo suas próprias estimativas. Algo como um quarto da população detinha ações em empresas privadas, massificando o capital. Quase 600 mil empregos foram transferidos do setor público para o setor privado”, conta o autor de “Pri­vatize Já”, lembrando que, no final dos anos 90, o desemprego na Inglaterra já era o menor da região.

Um sucesso que não serviu de alerta para a França do socialista François Mitterrand, que chegou ao poder em 1981 e tratou de intensificar a “mentalidade estatólatra” que sempre caracterizou o povo francês. “Os dois primeiros anos do governo de Mitterrand foram marcados por um grau estatizante quase sem precedentes”, afirma Rodrigo Constantino. Com isso, a inflação chegou a 14% ao ano e o número de desempregados ultrapassou a casa de 2 milhões de pessoas. Resultado: já em 1983, a França socialista de Mitterrand teve de acompanhar a Inglaterra liberal de Thatcher, iniciando, ainda que com mais timidez, o seu processo de privatização.



Máfias no comando
Mesmo não sendo tão radical quanto a privatização de Thatcher, a privatização de Mitterrand – que possibilitou a venda de 65 estatais, entre elas o canal de televisão TF1 – levantou 50 bilhões de francos para os cofres públicos e foi finalizado em apenas seis meses, merecendo a aprovação de 41% dos franceses, enquanto 27% eram contrários. “Por quase todos os pontos de vista, a privatização francesa foi um sucesso. O número de acionistas saltou de 1,5 milhão para 8 milhões, e a popularidade era enorme. O governo separou 10% das ações para os empregados, que teriam direito a grandes descontos. Era a versão francesa do ‘capitalismo do povo’, só que mais tímido que o inglês”, escreve Constantino, que apresenta uma série de indicadores comparando o desempenho da França com outros países europeus. Mesmo ficando aquém da Alema­nha e da Inglaterra, sempre mais arrojadas na direção do livre mercado, a economia francesa melhorou substancialmente com as privatizações e, no entender do autor, a França poderia estar em maus lençóis, se a desestatização do socialista Mitterrand não tivesse sido aprofundada por Jacques Chirac.

Mas se “privatizar” não é o palavrão que se tornou no Brasil também não chega a ser um abracadabra. E um exemplo de que a privatização pode não funcionar a contento vem da Rússia. Com o fim do império comunista em 1991, as antigas repúblicas que se abrigavam sob a foice e o martelo estiveram perto da anomia. Máquinas, armas e outros bens do Estado eram roubados pelos membros do Partido Comunista, o que Anatoly Chubais – um dos artífices das reformas de Boris Yelstin na Rússia juntamente com Yegor Gaidar — chamava de “privatização espontânea”. Para reverter esse quadro e conquistar apoio popular para as reformas, os gestores da privatização russa decidiram distribuir as propriedades estatais entre a população por meio da distribuições de vouchers para 148 milhões de russos. “O problema é que, em um país recém-saído do socialismo, a demanda reprimida era gigantesca diante da miséria. Com um presente caído dos céus, os russos partiram em busca de bens básicos, trocando os vouchers por qualquer quantia possível, incluindo garrafas de vodka”, relata Constantino.

“Em 20 meses, algo como 14 mil empresas seriam leiloadas pelo mecanismo de vouchers, sendo que muitas delas sequer tinham balanços contábeis para avaliação dos potenciais compradores. No total, quase 70% da economia foi colocada em mãos privadas. O problema é que boa parte dessas mãos pertencia a figuras obscuras, gente com informação privilegiada por ter ligação com a antiga elite política”, afirma Constantino. Depois de mais de 70 anos sob o jugo do comunismo, a Rússia estava aprendendo o que era propriedade privada, uma vez que a maioria dos russos já nascera num mundo coletivista, em que o Estado era a encarnação de Deus. “O capitalismo russo nascia torto e em 1998 já entraria em colapso. Os oligarcas escolheriam então um tenebroso ex-agente da KGB, Vladimir Putin, para substituir Yeltsin no poder. Eles pensavam que seria fácil usar esse jovem de confiança como marionete de seus interesses. Não contaram com o risco de a criatura se voltar contra seus criadores e tentar absorver todo o poder para si”, sustenta Constantino, acrescentando que, “após a rápida fase capitalista, a Rússia iria mergulhar uma vez mais na autocracia, com Putin reassumindo o papel de czar da ‘modernidade’”.
Capitalismo de Estado

Mesmo gerando um monstruoso capitalismo de Estado, controlado por máfias gestadas nos porões do antigo regime comunista, a privatização russa aumentou a renda da classe média e, por mais que tenha defeitos, não pode ser comparada à fome que grassava nos piores momentos do regime comunista, como a fome ucraniana entre 1932 e 1933, que provocou a morte de cerca de 6 milhões de pessoas. O mesmo se pode dizer das privatizações na China, um avanço em relação ao primitivismo econômico da Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung, que se arvorava a proibir até as flores de nascer, por julgá-las inúteis. Ao contrário de muitos políticos brasileiros, nem sempre de esquerda, que enaltecem sem ressalvas a economia chinesa, Rodrigo Constantino reconhece que a China padece de muitos problemas, começando pela completa falta de liberdade política. Evidentemente isso se reflete na economia: “O setor financeiro ainda é dependente dos interesses estatais, levando ao problema da má alocação e recursos em muitos casos”.

“Privatize Já” também aborda as privatizações latino-americanas. No Chile, a privatização foi efetivada por uma espécie de parceria entre os economistas da Universidade de Chicago e a ditadura do general Augusto Pinochet, que, ao menos em termos econômicos, comportou-se como um déspota esclarecido. Infelizmente, o ideário liberal não vicejou de baixo para cima entre os chilenos — teve de ser imposto por canhões e coturnos. O Chile de Pinochet e a Inglaterra de Thatcher, ainda que por caminhos políticos radicalmente opostos, são considerados modelos de privatização bem-sucedida. Basta comparar o Chile à Argentina, hoje, para se perceber o abismo social e econômico em que um Estado ditador e metido a empresário pode enfiar um país.

Como observa Cons­tan­tino, o Chile possui a maior renda per capita e o maior Índice de De­senvolvimento Humano da vizinhança. Enquanto isso, a Argentina, castigada pelo populismo, sai de uma crise para cair noutra, enrascada em que o Brasil estaria metido se Fernando Henrique não tivesse dado um basta nos planos mirabolantes dos desenvolvimentistas que pariram o Plano Cruzado.
A “Boibrás” do BNDES

Rodrigo Constantino avalia como positiva as privatizações brasileiras. E vale a pena se debruçar atentamente sobre os dois capítulos do livro que tratam da experiência no Brasil. O autor compara várias empresas antes e depois das privatizações, como a Embraer, a Vale do Rio Doce e o setor de telefonia, não havendo como negar que a venda das estatais foi boa para o país — a não ser que o leitor queira tapar o sol dos fatos com a peneira furada da ideologia socialista. Mesmo o processo de privatização tendo beneficiado grandes empresários (que, como o próprio Constantino reconhece, “não costumam gostar do livre mercado”) ele ainda foi positivo para o País, pois tirou das costas do erário estatais que só davam prejuízo. Sem contar que o próprio Plano Real, sem o programa de privatização, teria fracassado, a exemplo de seus antecessores, que tentaram vencer a inflação sem abrir a economia e estimular a concorrência. Até porque ineficiência e corrupção, como mostra Cons­tantino, fazem parte da natureza das estatais.

Infelizmente, esse Brasil tucano um pouco menos estatizante (no campo econômico apenas, pois FHC foi quem começou a estatizar o social) está sendo desmontado na Era Lula, continuada pela presidente Dilma Rousseff. O governo petistas decidiu privatizar estradas e aeroportos, mas sua ação direta no meio empresarial cresce a olhos vistos. Citando reportagem da revista “Época”, Constantino observa que o governo tem influência em cerca de 700 empresas, começando pelo fato de que é o Estado é maior banqueiro do país, representando quase 50% do setor via bancos públicos. Para Rodrigo Constantino, o BNDES “se tornou uma verdadeira ‘Bolsa-Empresário’ durante o governo petista”, comandando um orçamento paralelo que transfere bilhões para grupos poderosos. Um deles é a JBS, que Constantino chama de “Boibrás”: “A JBS, por exemplo, recebeu tantos recursos do banco (mais de 10 bilhões de reais), que este acabou virando sócio com um terço do negócio, pois ficou inviável a empresa honrar todos os seus compromissos financeiros”. Neste cenário em que o governo petista estatiza o capitalismo, transformando empresários em sócios do Estado, “Privatize Já”, de Rodrigo Constantino, é um livro oportuno. Ela tenta mostrar a nós, brasileiros, que existe vida fora do Estado.  

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Exagero na mordomia

O Estado de S.Paulo

O mau comportamento das casas legislativas em todos os níveis - municipal, estadual e federal -, no que se refere ao acentuado gosto por privilégios e benesses para seus integrantes, não permitia que se esperasse da Assembleia paulista uma atitude diferente, marcada pela austeridade. Mas os deputados estaduais paulistas estão exagerando. Seu apetite - ou, melhor dizendo, sua gulodice - os tem feito ir além da média das mordomias, como mostram dois exemplos que frequentaram o noticiário neste início de ano.
O primeiro foi o da tentativa, felizmente frustrada, de renovar a frota de 150 carros para uso dos parlamentares e diretores da Casa. Não vale mais a pena discutir se eles precisam ou não dessa facilidade, de tal forma ela se incorporou aos usos e costumes dos integrantes dos altos escalões dos Três Poderes. Mas não é preciso exagerar, como infelizmente eles assim fizeram em dois pontos importantes.
Um foi a rapidez na mudança dos atuais carros, que têm apenas dois anos de uso. Como os deputados sempre dispuseram de veículos de boa qualidade, resistentes, eles certamente têm condições de uso em segurança por um bom tempo ainda, não havendo motivo para troca.
Acontece que, como apurou reportagem do Estado, suas excelências, sempre exigentes, preferem um outro modelo, na mesma faixa de qualidade e preço.
Caprichos de quem não precisa pagar a conta. Foi isso, ao que tudo indica, que levou ao segundo e mais importante exagero. O edital de licitação para a compra dos carros, publicado no Diário Oficial do dia 12 de janeiro, estabeleceu exigências tais - de potência, de mecânica, de conforto e até de características dos pneus - que limitaram muito a escolha.
De tal forma que ela na prática orientava a compra para um determinado modelo, que é o da preferência dos deputados e diretores da Casa. O segundo secretário da Assembleia, deputado Aldo Demarchi (DEM), que cuida da operação, negou qualquer "encaminhamento" da licitação, o que seria irregular. E fez isso numa linguagem, supostamente engraçadinha, que destoa da seriedade do assunto, um negócio da ordem de R$ 11 milhões: "A única coisa que estamos preocupados, e é a reclamação de todos os deputados, é a segurança. Vida, bicho".
Não foi bem isso o que pensaram oito procuradores do Ministério Público de Contas, que entraram no último dia 22 com uma representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE)pedindo a suspensão imediata da licitação.
A seu ver, o edital fere a lei de licitações e "desborda aos limites da discricionariedade, ao estabelecer exigência que restringe indevidamente a competitividade, por eliminar concorrentes idôneos e aptos a fornecerem veículos com condições de bem atenderem às necessidades para que se destinam".
Tanto tinham razão os procuradores que a direção da Assembleia teve o bom senso de cancelar a licitação.
O outro exemplo da ligeireza com que a Assembleia trata o dinheiro público é o pagamento de auxílio-moradia - de R$ 2.250,00 por mês - aos deputados. O benefício é concedido a todos os 94 parlamentares. Aos que têm e aos que não têm residência na capital. Ligeireza que acaba de ser punida com decisão do juiz Luís Manuel da Fonseca Pires, da 13.ª Vara da Fazenda Pública. Ele concedeu tutela antecipada em ação civil do Ministério Público do Estado e determinou a "imediata suspensão" do pagamento do auxílio-moradia.
Isso deve ser feito "sob pena de os responsáveis, em caso de descumprimento da medida, responderem por ato de improbidade administrativa". Alega o magistrado que "inexiste diferença entre o parlamentar que reside em imóvel próprio ou alugado, próximo ou distante da Assembleia Legislativa, como ainda não há o condicionamento do pagamento à comprovação de gastos com a moradia". Em outras palavras, recebe o auxílio mesmo quem não precisa e ninguém comprova despesas feitas.
Seria bom que a Assembleia aprendesse alguma coisa com esses dois casos. Quem sabe?

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Eu não aceito!


Roberto da Matta para O Estado de S. Paulo

Quando o hígido Michel Temer vira poeta e Renan Calheiros - acusado pela Procuradoria Geral da República de peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso - é apossado (com voto secreto - o voto da covardia) na Presidência do Senado Federal no posto número 3 da sucessão republicana e entra no papel dando uma aula de ética e com apoio do PSDB, um lado meu pergunta ao outro se não estaria na hora de sumir do Brasil.

Se não seria o momento de pegar o meu chapéu e deixar de escrever, abandonar o ensino das antropologias, desistir do trabalho honesto, beber fel, tornar-me um descrente, aloprar-me, abandonar a academia (de ginástica, é claro), deixar-me tomar pela depressão, desistir de sonhar, aniquilar-me, andar de joelhos, dar um tiro no pé, filiar-me a uma seita de suicidas, mijar sentado, avagabundar-me, virar puxa-saco, fazer da mentira a minha voz; e - eis o sentimento mais triste - deixar de amar, de imaginar, de ambicionar e de acreditar. Abandonar-me a esse apavorante cinismo profissional que toma conta do País - esse inimigo da inocência -, porque minha cota de ingenuidade tem sido destroçada por esses eventos. Eu não posso aceitar viver num país que legaliza a ilegalidade, tornando-a um valor. Eu não posso aceitar um conluio de engravatados que vivem como barões à custa do meu árduo trabalho.

"A ética não é um objetivo em si mesmo. O objetivo em si mesmo é o Brasil, é o interesse nacional. A ética é obrigação de todos nós e é dever deste Senado", professa Renan Calheiros, na sua preleção de po(s)se.

Para ele, a ética, o Brasil, o dever, o interesse e as obrigações são coisas externas. Algo como a gravata italiana que chega de fora para dentro e pode ou não ser usada. Façamos uma lei que torne todo mundo ético e, pronto!, resolvemos o problema da cena política brasileira - esse teatro de calhordices.

A ética não é a lei. A lei está escrita no bronze ou no papel, mas a ética está inscrita na consciência ou no coração - quando há coração... Por isso, ela não precisa de denúncias de jornais, nem de sermões, nem de demagogia, nem da polícia! A lei precisa da polícia, o moralismo religioso carece dos santarrões e as normas, de fiscais. A ética, porém, requer o senso de limites que obriga à mais dura das coragens: a de dizer não a si mesmo e, no caso deste Brasil impaludado de lulopetisto, a de negar o favor absurdo ou criminoso à namorada, ao compadre, ao companheiro, ao irmão, ao amigo.

"O Zé é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo!", eis a cínica palavra de ordem de um sistema totalmente aparelhado e dominado pelo poder feito para enriquecer a quem o usa, sem compostura, o toma lá dá cá com tonalidades pseudoideológicas, emporcalhando a ideologia.

Quem é que pode acreditar na possibilidade de construir um mundo mais justo e igualitário no qual a esfera pública, tocada com honestidade, é um ideal, com tais atores? Justiça social, honestidade, retidão de propósito são valores que formam parte da minha ideologia; são desígnios que acredito e quero para o Brasil. Ver essa agenda ser destruída em nome dos que tentaram comprar apoio político e hoje se dizem vítimas de um complô fascista, embrulha o meu estômago. Isso reduz a pó qualquer agenda democrática para o Brasil.

O cínico - responde meu outro lado - precisa (e muito) de polícia; o ético tem dentro de si o sentido da suficiência moral. Ela ou ele sabem que em certas situações somente o sujeito pode dizer sim (ou não!) a si mesmo. Isso eu não faço, isso eu não aceito, nisso eu não entro. É simples assim. A camaradagem fica fora da ética, cujo centro é o povo como figura central da democracia.

O que vemos está longe disso. Um eleito condenado pelo STF é empossado deputado, Maluf - de volta ao proscênio - sorri altaneiro para os fotógrafos, um outro companheiro com um passado desabonado por acusações vai ser eleito presidente da Câmara; a presidente age como a rainha Vitória. E o Direito: o correto e o honesto viram "direita". Entrementes, a "esquerda" tenta desmoralizar a Justiça porque não aceita limites nem admite abdicar de sua onipotência. Articula-se objetivamente, com uma desfaçatez alarmante, uma crise entre poderes exatamente pela mais absoluta falta de ética, esse espírito de limite ausente dos donos do poder neste Brasil de conchavos vergonhosos e inaceitáveis. Você, leitor pode aceitar e até considerar normal. Eu não aceito!

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Impunidade sem fim: Cachoeira, Genuíno, Renan... Até quando?



Sim, a culpa é sua, 
que acha que a responsabilidade não é sua,
que vota nos mesmos parasitas de sempre,
que vê tudo isso e fica calado,
que se contenta com esmola, cerveja e futebol...
Acorda Brasil!



Povo Brasileiro!

Acabamos de ser chamados de Palhaços!!!

O Senador Renan Calheiros acaba de ser eleito Presidente do Senado com 56 votos secretos!!! I

sso é um absurdo! E não podemos ficar calados diante de tal ATROCIDADE!!!

Não podemos ficar de mãos atadas!