quinta-feira, 22 de outubro de 2009

ARTIGO NO ZERO HORA
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O desafio das democracias
por Felipe Quintana da Rosa
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Temos presenciado sucessivas ações de governantes latino-americanos em favor de reeleições consecutivas, ou até mesmo indefinidas, visando a suas permanências no poder. Com base em propostas de reformas constitucionais, esses governantes fazem do continuísmo uma tendência contemporânea e perigosa no continente. Como consequência disso, constatamos a fragilização das instituições democráticas em vários países latinos e a perda de diversos direitos individuais dos cidadãos.
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Não pode prevalecer o entendimento de que a legitimidade dessas ações decorreria de sustentação populacional majoritária. Mesmo que haja maioria a favor de reeleições consecutivas ou indefinidas, como pretende o presidente venezuelano Hugo Chávez, por exemplo, não se pode olvidar que os conceitos democráticos não estão assentados apenas na vontade da maioria. Engana-se também aquele que considera democrática a mudança na Constituição de um país com base em momentâneo e transitório apoio popular, como pretendeu o ex-presidente Manuel Zelaya, em Honduras.
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É lícito afirmar que o sistema democrático comporta necessariamente a conjunção de duas vertentes: o governo da maioria e a proteção aos direitos das minorias. A maioria governante nunca pode desfrutar de poderes ilimitados. Independentemente de sua crença, origem étnica, poder aquisitivo ou convicções ideológicas e políticas, as minorias eventualmente vencidas em uma eleição devem ter, sempre, seus ideais respeitados em um ambiente democrático maduro. Por isso, há necessidade de se garantirem liberdades individuais a todos, assegurando, sem jamais transigir, a liberdade de expressão, a igualdade de todos perante a lei e a possibilidade de qualquer cidadão participar da vida política e econômica.
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Esses preceitos devem ser severamente observados por todo e qualquer governante, a fim de que sejam cada vez mais consolidados os ideais democráticos. Por constituírem uma elite política, os representantes do povo deveriam ter a obrigação de zelar pela manutenção desses ideais e de observar o princípio da alternância de poder. Foi sobre os valores de respeito às minorias e liberdades fundamentais que as democracias mais sólidas do mundo se consolidaram ao longo dos anos. Esquecer disso pode acarretar um alto custo à própria democracia, que rapidamente pode ser confundida com tirania e autoritarismo, o que já ocorre na vizinha Venezuela.
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O país que não assegura tais direitos individuais fundamentais, tão arduamente conquistados pelas sociedades ao longo dos anos, e concede ao titular de um mandato presidencial poderes que extrapolam os limites da democracia – fato que vem ocorrendo sistematicamente na América Latina – não pode ser considerado democrático.
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Fonte: Zero Hora

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