Rodrigo Constantino para O Globo
Nunca antes na história deste país se viu tantas medidas de governo serem desfeitas em tão pouco tempo. O governo Dilma está perdido, sem rumo, sem saber como reagir ao desabamento de sua popularidade, ao risco inflacionário, ao pífio crescimento. Falta um plano de voo, um mapa correto do território. E falta, naturalmente, conhecimento básico de economia.
O principal problema, creio eu, está na visão equivocada que a presidente e sua equipe têm acerca do funcionamento da economia. Eles são reféns de uma ideologia desenvolvimentista que simplesmente não funciona. Eles erram o diagnóstico dos males que assolam o país, não tendo como acertar na receita. Ficam, assim, ao sabor do vento, do marqueteiro, tateando no escuro, tratando o país como um rato de laboratório.
E qual seria essa visão equivocada? Em resumo, é a crença arrogante de que o governo pode, de cima, controlar os dados econômicos nos mínimos detalhes. Esse tipo de mentalidade denota incrível soberba, pois nem o mais sábio dos sábios seria capaz de substituir milhões de agentes autônomos tomando decisões independentes no livre mercado.
Prêmio Nobel de Economia, o austríaco Hayek mostrou como as informações relevantes para as tomadas de decisão estão dispersas. Cada um, exercendo seu poder de escolha em sua determinada área, acaba levando uma minúscula parcela de informação que irá influenciar os demais. E o mecanismo de transmissão dessa informação toda são os preços.
Mas o governo Dilma desconfia do mercado, desdenha desse poderoso mecanismo “caótico”, sem um controlador no leme, direcionando cada parte importante do todo. Por isso ele pensa ser viável controlar esses preços, com base em decretos estatais. Por isso tanta intervenção na taxa de juros e de câmbio, no preço da energia, no retorno das concessões.
Nada disso é novo, naturalmente. A União Soviética contava com um órgão, a Gosplan, cuja missão hercúlea — e impossível — era justamente administrar milhares de preços da economia. O resultado, como sabemos, foi o lançamento do Sputinik, enquanto faltava papel higiênico para a população. Fantástico!
Essa “arrogância fatal”, para usar expressão cunhada por Hayek, está no cerne de nossos problemas. O governo distribuiu crédito público sem se dar conta da falta de lastro na poupança, mexeu na taxa de juros sem calcular seu impacto na inflação, congelou a gasolina, usou o BNDES para selecionar os “campeões nacionais” (entre eles a EBX, de Eike Batista) etc. O governo seria o mestre do universo!
Só que não, isso não funciona. Mesmo assumindo uma premissa um tanto agressiva, de que Dilma é de fato uma excepcional gestora e que Guido Mantega é o mais inteligente dos economistas, o modelo não entregaria o resultado desejado. Agora vamos relaxar essa hipótese e aceitar premissas mais, digamos, realistas, de que Dilma não foi capaz nem de sustentar uma pequena loja na iniciativa privada e que Mantega é somente um economista medíocre, e teremos a gravidade do quadro.
Foi poder demais concentrado em gente de menos. Não tem como dar certo. E, agora, os mesmos que plantaram as sementes podres olham aturdidos para a colheita maldita. Coçam suas cabeças, buscam bodes expiatórios em todo lugar, e nada. Partem, então, para malabarismos medonhos, no afã de enganar o público, ou para medidas desesperadas e erráticas, gerando enorme insegurança no mercado.
Sem credibilidade alguma, o governo ainda sonha em atrair as dezenas de bilhões que o país precisa para investimento em infraestrutura, um dos nossos maiores gargalos de produtividade. Mas como, meu Deus!, esses investidores vão alocar seus recursos se o governo mexe nas regras do jogo o tempo todo, quer determinar a taxa de retorno abaixo do mercado, altera as tarifas e tudo mais?
A farra toda durou porque leva tempo até o problema emergir. O modelo, que começou ainda na gestão de Lula, foi baseado nos três Cs: Consumo, Crédito e Commodities. Estas pararam de subir, pois a China não tem mais a mesma pujança. E aqueles bateram no limite de crescimento artificial, pois as famílias já se encontram bastante endividadas.
O que fazer? Como reagir? Revertendo essa absurda concentração de poder no Estado. Parando de manipular preços. Cortando gastos públicos. Fazendo as reformas trabalhista, previdenciária e tributária. Adotando, enfim, uma agenda liberal. E esse governo vai seguir nessa direção? Nem nos meus sonhos! Logo, só nos resta torcer que o cego no meio do tiroteio não leve uma bala perdida. Somos dependentes, hoje, da sorte.
Rodrigo Constantino é economista e presidente do Instituto Liberal
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