sábado, 5 de dezembro de 2009

O TEMPO
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O golpe das tarifas
A omissão dos governantes é imperdoável. Soa nitidamente como confissão de responsabilidade.
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Não foram R$ 7 bilhões, mas R$ 40 bilhões, segundo técnicos da CPI das Tarifas Elétricas, os excessos de cobranças sobre as contas dos usuários de 2002 a 2009. O valor estratosférico se apresenta assim como a maior apropriação indébita ocorrida no Brasil desde que Álvares Cabral pisou nas praias de Porto Seguro.
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Deveria, portanto, haver o máximo rigor na apuração. Até se justificaria uma busca preventiva imediata de documentos e de arquivos nas residências e escritórios dos envolvidos, como fizeram com Maluf e outros tantos. O relatório final da CPI, debaixo de uma casca sutil de indignação, retirou da lista dos suspeitos, por intervenção do governo, cerca de 20 dirigentes da Aneel e o próprio presidente da agência, Nelson Hubner.
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Dependendo do relatório da CPI, pouco vai acontecer e, se depender do chefe da nação, tão solícito nas críticas a qualquer mosquito que levante o voo, absolutamente nada acontecerá. O texto inicial do relatório até que previa o indiciamento daquela que poderia passar à história como a quadrilha mais bem organizada do país, mas nela se contam apenas felizardos muito bem apadrinhados; e, se mexer com eles, poderia explodir uma bomba tão potente a ponto de machucar muitas cabeças coroadas da República.
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Cargos em agências governamentais são disputados a tapa e foices no escuro. Passam pela aprovação do presidente e são, sem dúvida, as moedas mais valiosas no submundo da politicagem. Nascidas para atender a uma nobre finalidade, hoje servem para comprar apoios no Congresso Nacional ou para atender a fome dos companheiros.
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Os nomeados em agências deixaram de sê-lo pela capacidade técnica, pela especialização e pelo notório saber. O que conta é o "padrinho", e na Aneel tem que ser padrinho dos fortes.O "erro tarifário" da Aneel, que rendeu um butim de R$ 40 bilhões, mostra a importância dos cargos que oferece. Em sete anos, as concessionárias tiraram de seus usuários, apenas com uma "inocente" malandragem, valores que permitiriam construir quatro usinas de Itaipu e deixar o país ao reparo de apagões até 2050.
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Se nesse caso não for necessária uma investigação minuciosa da Polícia Federal, a mobilização do Congresso Nacional, do Judiciário e do TCU, não o será para mais nada. Collor, quando presidente, caiu por um carro Elba. Nesse caso, desapareceram 2 milhões de carros Elba.
A Presidência da República, guardiã do país, deveria se focar com toda a disposição nesse assunto, infinitamente mais importante do que um terrorista italiano ou um caudilho hondurenho com chapéu de cowboy. Trata-se ainda de devolver urgentemente ao povo seu suado dinheiro, que lhe foi surrupiado com aquiescência da Aneel.

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Os R$ 40 bilhões, por outro foco, representam três anos de benefícios do Bolsa Família. Tira-se assim de um lado com contas de luz, água, esgoto, transporte público, gás de cozinha, taxas de toda espécie e combustíveis para devolver-se do outro, provavelmente com saldo negativo. A omissão e o silêncio dos governantes, no caso Aneel, são inexplicáveis, imperdoáveis. Soam nitidamente como confissão de responsabilidade.
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É uma vergonha.
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Vittorio Medioli - vittorio.medioli@otempo.com.br
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fonte: Jornal O Tempo

Um comentário:

Laguardia disse...

Se você deixa de pagar a sua conta de energia, a concessionária corta o fornecimento até você quitar a dívida. Mas se a dívida é deles para conosco, então nada acontece.